Centro de documentação
e arquivo feminista
elina guimarães

Projeto
História e memória de mulheres cabo-verdianas em Portugal

INTRODUÇÃO

Trazer as vozes de quem tem ficado silenciado na história constitui um processo crucial na História das Mulheres. Este tem sido o lema da UMAR no desenvolvimento das diversas fases do projeto “Memória e Feminismos”.

No rescaldo do processo colonial, uma grande comunidade de imigrantes oriundas das ex-colónias instalou-se em Portugal. Destas comunidades salienta-se a cabo-verdiana por ser a mais expressiva em número de imigrantes.

Relativamente ao papel da mulher cabo-verdiana na sociedade portuguesa, somos levadas rapidamente associá-las a trabalhadoras domésticas ou ao universo musical. Mas as mulheres cabo-verdianas são muito mais do isso. E, que caminhos trilham estas novas gerações?

Durante o desenvolvimento da última edição deste projeto sobre “Múltiplas Discriminações”, a figura de mulheres cabo-verdianas como empregadas domésticas e de limpeza levou-nos a pensar que elas mereciam que as suas vozes fossem ouvidas. Relativamente a este assunto, tivemos uma tertúlia com trabalhadoras domésticas e de limpeza, no dia 23 de março; uma sessão com uma ex-trabalhadora doméstica interna no dia 22 de maio e o um painel no seminário final dedicado a este tema.

Ficou-nos também como referência o documentário de Raquel Freire “Mulheres do meu país”, apoiado pela SECI, onde a vida destas mulheres que saem às 5h da manhã de suas casas, para entrarem em escritórios ou em outras casas, realizando serviços de limpeza, mal pagos e sem direitos.

Este projeto iria também acompanhar o percurso de outras mulheres e jovens que, vivendo em Portugal há vários anos, continuam a ter ligações ao seu país.

Os nossos contactos com a Organização de Mulheres de Cabo Verde (OMCV) vão permitir que esta ligação se faça, tanto mais que a OMCV está muito interessada na colaboração da UMAR para a valorização do seu espólio documental (escrito e oral), pelo que esta recolha de histórias de vida também contribuiria para o reforço do seu trabalho nesta área.

Em relação às jovens cabo-verdianas precisamos de saber o nível de mobilidade social que elas perspetivam nas suas vidas, que estudos prosseguem e que dificuldades estão colocadas.

Principais características dos percursos imigratórios das mulheres cabo-verdianas em Portugal

Segundo um trabalho de investigação da socióloga Karin Wall1 existem mudanças nas trajetórias de imigração das mulheres. De uma situação em que o marido imigrava primeiro e depois chamava a mulher e os filhos, tem-se vindo a assistir a uma imigração de carácter mais individual em que a mulher imigra sozinha ou com os filhos.

Sabendo-se que em Cabo Verde a maioria das famílias monoparentais são chefiadas por mulheres2 é de considerar que grande parte das mulheres imigrantes em Portugal entram sozinhas e depois mandam vir os/as filhos/as que ficam a cargo das suas famílias ou emigram logo com os filhos.

Esta situação conduz a situações de maior vulnerabilidade económica e social quando sabemos que os empregos encontrados são desvalorizados e mal pagos.

No final da década de 1960 a comunidade cabo-verdiana era a que mais enraizada estava em Portugal, constituindo assim uma das mais antigas a residir no país. Neste trabalho, não se pretende seguir os trajetos das mulheres que emigraram nessa altura, mas as histórias de vida das que mais recentemente entraram no país. Não se trata de um trabalho sociológico em que se estudem os fatores que levaram ou não à mobilidade social das mulheres que entraram na década de 1960 em Portugal, mas tão só de entender, através de histórias de vida, os fatores que levam a que mulheres cabo-verdianas saiam do seu país numa vaga de emigração mais recente.

Segundo a dissertação de mestrado de Carla Silva Lopes3 “Mulheres imigrantes em Portugal: vivências e percursos migratórios das mães solteiras cabo-verdianas”, o fator económico constitui a principal razão que desencadeia a decisão de emigrar por parte das mães solteiras cabo-verdianas., sendo a emigração a fuga à pobreza em que se encontravam no seu país. A principal dificuldade no país de acolhimento é a falta de documentação.

Sabemos que a integração social das mulheres cabo-verdianas é um processo multidimensional e engloba questões de natureza jurídica, cultural, económica, política, social, entre outras. Ainda, segundo o estudo de Carla Silva Lopes, a integração das mulheres cabo-verdianas envolve um conjunto complexo de fatores: estar legalizado, saber falar o português, ter trabalho, ter os filhos consigo, etc. Muitas, apoiam-se em familiares que já têm em Portugal, em especial a nível habitacional, continuando a viver em locais periféricos na zona da Grande Lisboa. Apesar das dificuldades enfrentadas, as mulheres cabo-verdianas imigradas preferem viver em Portugal, porque lhes permite maior poder de decisão sobre as suas vidas.

É um facto que estas mulheres sofrem múltiplas discriminações por serem mulheres, mães e imigrantes que procuram vidas autónomas.

O projeto que agora se apresenta inserido nesta perspetiva das múltiplas discriminações irá dar prioridade ao trabalho junto destas mulheres.

  1. Trajetórias de Mulheres Imigrantes em Portugal, VI Congresso Português de Sociologia, 2008.
  2. Diário de Notícias de 15 de maio de 2017.
  3. Dissertação de Mestrado apresentada na Universidade da Beira Interior orientada pela Professora Johanna Schouten em 2011.

Objetivos

Conhecer percursos de vida de mulheres cabo-verdianas em Portugal, em especial de mulheres que tiveram uma trajetória de imigração individual.

Analisar as expetativas de vida das suas filhas e o nível de mobilidade social que podem atingir ou que já conseguiram atingir.

Metodologias

Seguindo uma perspetiva interseccional, utilizaremos como em anos anteriores uma metodologia qualitativa, caracterizada pela proximidade que pretendemos com as mulheres cujas histórias de vida irão ser recolhidas.

No caso das mulheres cabo-verdianas a residir em Portugal esta proximidade exige um trabalho prévio de estabelecimento de laços de confiança e de aceitação das investigadoras como suas iguais.

1 – Trajetórias de Mulheres Imigrantes em Portugal, VI Congresso Português de Sociologia, 2008.
2 – Diário de Notícias de 15 de maio de 2017.
3-  Dissertação de Mestrado apresentada na Universidade da Beira Interior orientada pela Professora Johanna Schouten em 2011.