Centro de documentação
e arquivo feminista
elina guimarães
Projeto a Idade e o Género. Até onde vai o preconceito?
A Idade e o Género: até onde vai o preconceito?
O projeto “A idade e o género: até onde vai o preconceito? realizou no dia 29 de junho de 2021, a sua primeira tertúlia intitulada “Representação e imagem nas mulheres com mais de 65 anos”. Devido à pandemia a tertúlia foi efetivada via zoom. Participaram como oradoras: Ana Maria Pessoa, São José Lapa e Cristina Duarte. Com uma assistência deveras interessada, que colocou várias questões às oradoras, foram debatidas a incongruência da representação das mulheres nos media e na produção artística.
Para uma melhor elucidação do que foi dito, aqui ficam os textos de Ana Maria Pessoa e de São José Lapa
Pessoa, A. M. (2021) A Representação das mulheres mais de 65 anos: imagens e quotidiano.
No dia em que se iniciam as sessões públicas de divulgação do projeto A Idade e o género: até onde vai o preconceito?, desenvolvido pela UMAR, numa equipa liderada pela Teresa Sales, cabe-me a responsabilidade de fazer a primeira de três intervenções subordinadas ao tema A Representação das mulheres mais de 65 anos: imagens e quotidiano. Quando fomos convidadas para esta tertúlia online, ou seja, para uma conversa subordinada a um dos vários temas previstos para estes encontros ao fim de tarde, foi-nos dada total liberdade de ângulo de análise. Se por um lado o desafio foi estimulante, por outro, trouxe imensas dúvidas e necessidade de opções: depois de selecionar diversas possibilidades, optei por, numa primeira etapa, contextualizar o tema que aqui nos reuniu, partilhando dados e definições sobre o que é a velhice, o envelhecimento e o idadismo tendo em conta as mulheres de mais de 65 anos, em Portugal; numa análise mais focada, partilho a reflexão sobre estereótipos e preconceitos comuns, embora normalmente sub-reptícios, nas referências a este grupo, sobretudo da parte dos média, em especial na televisão e na publicidade, em diversos meios. Os percursos de construção assim como os processos de desconstrução deste tipo de representações são fundamentais para que se possa entender como aqui se chegou e como se podem discutir, e sobretudo ultrapassar, os obstáculos ao reconhecimento dos papeis que a sociedade contemporânea reserva àquela cada vez maior, embora invisível, parcela da população.
Dado o tipo de sessão no qual esta reflexão é feita, ou seja, uma tertúlia que tem de ser acessível a um público diverso, todas as ideias serão apresentadas numa forma oralizante embora todas tenham sido identificadas nas obras de referência que se enumeram, no final do texto, e que servem de guia a esta intervenção.
Texto para encontro da UMAR 29 de Junho de 2021 – São José Lapa
Boa tarde a todas as pessoas
Começo por vos falar de um caso que se passou comigo e que ilustra bem a forma subtil como as mulheres são invisibilizadas na produção cultural e artística:
Há dez anos atrás apresentei na RTP 1, eu e um colectivo de escrita o 1º episódio do projecto série para RTP 1″uma quinta entre a quarta e a sexta”.
Nos anos seguintes, falei com 2 dos directores de entretenimento, um ano um, anos depois outro…directores que se seguiram na rtp1 e seus assessores. Nada. Ou melhor NIM, porque lá me iam recebendo e ouvindo, mas iam empurrando com a barriga.
Cinco anos depois e já com a realização do episódio piloto, de “Uma quinta entra a quarta e a sexta” (nós não somos de desesperar nem desistir), entreguei na estação do estado no canal 1 e mais tarde na SIC, o dvd com tal produto. Só para vos dar um exemplo das dificuldades que tivemos de superar, posso contar que para realizar o episódio piloto, reuni um conjunto de atores, realizador que já connosco havia trabalhado em teatro, câmara, iluminação, toda uma produção profissional, disponibilizei o Espaço das Aguncheiras, onde filmámos os exteriores e os interiores em cenários construídos para o efeito. Tudo isto foi pago com o trabalho empenhado das e dos colegas, atores e equipa técnica,que tal como eu acreditaram no projeto. O produto final tem muita qualidade,
podia não ser um produto completamente mainstreaming, mas era divertido e tinha e tem um lado pedagógico. Nós acreditámos que podia ser uma pedrada no charco (frase utilizada nos anos 60) mas não nos deram a oportunidade de experimentar.
Cristina L. Duarte
Ensaio à margem: RI 65+ ou a idade da razão
Sobre a representação e a imagem das mulheres com mais de 65 anos, até onde vai o preconceito? Até encontrarmos pistas de investigação, passamos em revista a origem da palavra, que são duas, em latim: prae e concepto. Segundo o Adorno (1950, A personalidade autoritária), os preconceitos são construídos a partir das necessidades pessoais dos indivíduos que os defendem. Nas olimpíadas da assimetria (e não, não estou a falar de moda) quem permanece na pista e luta até ao fim, parecem ser as com mais de 65. Por vezes, esta mulher, vai por etapas, faz corta mato, e evita as pedras do caminho. A dada altura, faz paralelas, outras vezes equilibra-se na trave, nas estafetas é onde se sai melhor, porque implica trabalho de equipa, mais participativo, num processo que se assemelha a uma corrida de fundo, para cada uma e para todas.
Metáforas esgotadas, a minha aproximação ao tema faz-se antecipando o problema…As entrevistadas, algumas participantes do meu estudo (NOVA FCSH, 2016), sobretudo as da geração nascidas nos anos 50 dão voz às nossas/minhas questões. Filomena observa criticamente que o corpo das mulheres é visto de uma forma muito consumista, “porque muito corpo de pendurar coisas. De tirar coisas. Roupa.” Para a Teresa o corpo das mulheres é muito mais olhado que o dos homens, e tanto por eles, como por elas. Segundo Margarida, as mulheres também olham para o corpo dos homens, só que eles comentam e elas não. O olhar dos outros acrescenta-nos leituras, que são também interpretações do que é ser ‘feminino’ ou ser ‘masculino’. O que vestimos, condiciona-nos ou exalta-nos? Sobretudo, entrega-nos a um papel, o de género, situado sobre um contexto real da vida quotidiana, qualquer que seja o tempo.